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Texto: Relatório Nacional da Educação no Contexto Socioeducativo. Abaixo, ilustração de avatares de adolescentes realizando diferentes atividades.

Levantamento inédito analisa como direito à educação vem sendo oferecido aos adolescentes que cumprem medidas socioeducativas no Brasil e aponta que apenas dois estados registram 100% de escolarização de jovens em meio fechado

O Observatório da Socioeducação – Centro Interdisciplinar de Educação Social e Socioeducação (CIESS) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e o Instituto Alana lançam nesta quinta-feira,  27 de abril, a pesquisa Panorama Nacional da Educação no Contexto Socioeducativo, que analisa como o direito à educação vem sendo oferecido aos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de meio fechado no Brasil, entre os anos de 2018 e 2019.

– Baixe a publicação na íntegra.

A pesquisa mostra que apenas cinco estados brasileiros registram 100% de escolarização de adolescentes e jovens que cumprem medidas na semiliberdade e, na internação, apenas dois estados. A taxa de escolarização é o percentual dos adolescentes em privação ou restrição de liberdade que estão matriculados efetivamente nas escolas, um direito garantido por lei. Além desse dado preocupante, a pesquisa também evidencia uma baixa padronização das informações sobre a escolarização, bem como destaca os desafios para a obtenção de informações, sistematização e gestão de dados. 

A partir das respostas obtidas, a taxa média de distorção idade-série para esse público no período analisado é alta: foi de 82,3% na semiliberdade, e na internação, 84,9%, enquanto a taxa de distorção nacional para os anos finais do ensino fundamental em 2018 era de 24,7%. Distorção idade-série é o termo utilizado para calcular a porcentagem de matriculados que possuem idade pelo menos dois anos maior do que aquela projetada para cada série do ensino. No Brasil, a taxa média é de cerca de 9%.

O maior valor da taxa de distorção idade-série entre adolescentes ou jovens em semiliberdade é de 100%, no estado de Tocantins; já o menor valor apresentado é de 60%, em Alagoas. Em comparação, a taxa geral de distorção idade-série entre todos os estudantes nesses estados, conforme o Inep, é, respectivamente, de 7,4% e 12,4%. 

– Veja também: Os direitos de gestantes e mães no sistema prisional e socioeducativo

Esses dados revelam que os adolescentes em privação ou restrição de liberdade têm seu direito à educação violado pelo próprio estado. “A garantia desse direito é imprescindível para a prevenção do envolvimento de adolescentes em atos infracionais”, destaca Pedro Mendes, advogado do Instituto Alana. “Observamos ainda que aluno que é deixado fora da escola tem violados também seu direito à profissionalização, à convivência comunitária e às demais ferramentas que possibilitariam o rompimento do ciclo de violência, criminalização e reincidência nos sistemas de privação de liberdade”.

Apagão de dados 

Das 27 unidades federativas do Brasil, 21 responderam aos pedidos de informação por, pelo menos, uma das secretarias demandadas, seja a Secretaria Estadual de Educação, seja as instituições de atendimento socioeducativo do estado, representando 81,5% do total das unidades federativas. Apenas em quatro (aproximadamente 15%) houve a resposta das duas secretarias acionadas.

Essa lacuna está presente tanto nos dados disponibilizados pelo governo federal quanto nos da esfera estadual. O levantamento aponta, ainda, para a necessidade de maior articulação entre os órgãos gestores de educação e pelos responsáveis pela gestão da socioeducação, voltada à elevação da escolaridade e à redução das desigualdades educacionais entre brancos, pretos e pardos.

A importância da articulação e sistematização de dados ficou ainda mais evidente no cenário educacional que se apresentou no período após a realização da pesquisa, uma vez que o contexto de pandemia pode ter alterado profundamente o cenário educacional. 

Pedro Mendes reforça a necessidade de ações que reduzam a desigualdade racial no acesso à educação e reconheçam a adolescência e juventude negra como principais alvos dos sistemas de justiça juvenil e socioeducativo. Essa tarefa, que demanda, também, a produção e sistematização de dados para embasar políticas públicas articuladas. Isso porque o perfil étnico-racial da população privada de liberdade no sistema socioeducativo, composta majoritariamente por adolescentes negros – conforme é verificado nos Levantamentos Anuais do SINASE –, evidencia a desigualdade na oferta educacional dentro e fora do sistema socioeducativo. 

Entretanto, não foram identificadas metas ou ações voltadas à elevação da escolaridade e à redução das desigualdades educacionais entre brancos, pretos e pardos nos planos estaduais de educação nem nos planos de atendimento socioeducativo. “Em resumo, a não garantia do direito à educação para os adolescentes que ingressam no sistema socioeducativo agrava os já elevados índices de evasão escolar ou de distorção idade-série deste grupo, muito superiores do que as médias estaduais”, explica Pedro. 

A pesquisa também apontou para uma baixa presença de informações e propostas de ações direcionadas à garantia do direito à educação no contexto socioeducativo tanto nos Planos Estaduais de Educação quanto nos Planos Estaduais de Atendimento Socioeducativo.

Conforme aponta Bruna Koerich, integrante do CIESS e uma das coordenadoras da pesquisa, “os Planos sistematizam o diagnósticos dos principais desafios a serem encarados na educação e na socioeducação, assim como as principais diretrizes e metas a serem alcançadas nesses setores. Por isso, a invisibilidade de discussões específicas da garantia de educação no contexto socioeducativo indica uma baixa preocupação com a temática e um cenário que tende à manutenção dos problemas identificados, como a falta de consolidação de dados e informações confiáveis”.

Veja alguns dos principais resultados da pesquisa:

  • Apenas cinco estados apresentaram taxa de escolarização de 100% na semiliberdade: Goiás, Amazonas, Tocantins, Paraná e Santa Catarina (este último, 97,8%); e dois na internação: Amazonas e Paraná. Por que isso acontece? O principal motivo para a não escolarização é a falta de capacidade das escolas em atender à demanda (29% dos respondentes) de acordo com levantamento anual do Sinase (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, 2017). 
  • Quase metade (13) dos estados da federação informou a existência de classe multisseriada no contexto socioeducativo, ou seja, classes em que estudantes de diferentes idades e anos letivos estudam juntos.
  • A taxa média de distorção idade-série na semiliberdade no período foi de 82,3%. Na internação, a média foi de 84,9%. 
  • É amplo o emprego da modalidade EJA (Educação de Jovens e Adultos), chegando a representar 100% das matrículas tanto na semiliberdade quanto na internação nos estados do Ceará, Goiás e Paraná. 
  • A participação da família ocorre principalmente por meio de reuniões entre equipe técnica, professores e familiares, por telefone ou presencialmente, em geral nos momentos de entrega dos boletins escolares.
  • A precariedade ou ausência absoluta de informação sobre o perfil educacional e a oferta escolar nos sistemas socioeducativos afeta a maioria dos estados. Isso torna evidente a incapacidade de acompanhamento e supervisão das atividades educativas escolares desenvolvidas nas unidades socioeducativas.

– Baixe a publicação na íntegra.
– Baixe o sumário executivo da pesquisa.

Confira o evento de lançamento da pesquisa:

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