71% das Secretarias Municipais de Educação realizam pouca ou nenhuma ação para implementar a Lei 10.639/03, promulgada há 20 anos para combater o racismo nas escolas
Estudo realizado com 1.187 Secretarias Municipais de Educação, o que equivale a 21% das redes municipais de ensino do país, revela que a maioria delas (71%) realiza pouca ou nenhuma ação para a efetividade da lei que há 20 anos obriga o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas. Apenas 29% das secretarias realizam ações consistentes e perenes para garantir a implementação da lei, revela a pesquisa “Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira“, de Geledés Instituto da Mulher Negra e do Instituto Alana, lançada nesta terça-feira, 18 de abril.
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Sancionada em janeiro de 2003, a Lei 10.639/03 alterou a legislação máxima da educação brasileira, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), e inseriu o ensino de história e cultura afro-brasileira no currículo da educação pública e privada do país, em um marco importante na luta do movimento negro por direitos, e uma conquista de todos os brasileiros.
“A pesquisa demonstra que o compromisso político é decisivo para a implementação assertiva da Lei 10.639, e, por isso, esperamos que os municípios que fizeram a escolha por educar para a igualdade racial possam inspirar outros a seguirem o mesmo caminho”, afirma Suelaine Carneiro, coordenadora de educação e pesquisa de Geledés.
O estudo foi realizado ao longo de 2022 e verificou como e se foram construídas condições pelas secretarias para combater o racismo estrutural, quais os passos percorridos, as lacunas existentes e os desafios que compõem o grave cenário da implementação da lei nas redes municipais de ensino, principais responsáveis pela educação básica do país. Elas atendem 49,6% de crianças e adolescentes, segundo dados do Censo Escolar da Educação Básica 2022, divulgados em fevereiro deste ano.
Realizada com o apoio institucional da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme), parceria estratégica da Imaginable Futures e elaborada pela Plano CDE, a pesquisa é o mapeamento de maior abrangência já feito sobre a aplicação da lei em nível municipal.
“É urgente reforçar o compromisso coletivo entre sociedade civil e representantes do poder público para o fortalecimento da Lei 10.639 na prática e para que possamos garantir condições para a sua realização também como enfrentamento ao racismo na área de educação e em toda a nossa sociedade”, diz Isabella Henriques, diretora-executiva do Instituto Alana.
Confira a seguir os principais destaques da pesquisa:
Qual o objetivo da pesquisa?
A pesquisa “Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira” apresenta o retrato indicativo sobre como e se as secretarias construíram ou não condições em suas estruturas para implementar a lei e contemplar os currículos com seus conteúdos e práticas, como é previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira.
Como a pesquisa foi feita?
Por meio da aplicação de questionário estruturado, que contou com a resposta de gestores de 1.187 Secretarias Municipais de Educação, o que equivale a 21% das redes municipais de ensino do país, com representação em todos os estados e de cidades de diferentes portes. Os questionários foram distribuídos e aplicados digitalmente e as informações foram coletadas por autopreenchimento voluntário.
Qual o perfil das secretarias, gestoras e gestores municipais respondentes?
A maioria das pessoas que responderam à pesquisa foram os próprios dirigentes de educação dos municípios ou técnicos das secretarias, que possuem experiência na pasta. 40% dos respondentes têm mais de 20 anos de experiência na secretaria e 57% são dirigentes. Além disso, 78% das respondentes são mulheres.
Quais os principais achados da pesquisa?
A pesquisa agrupou as Secretarias Municipais de Educação em três principais perfis:
1. os municípios que realizam ações consistentes e perenes para a implementação da lei (29%);
2. os que realizam ações de maneira menos estruturada (53%);
3. os que não realizam nenhum tipo de ação (18%).
A maioria das redes (71%) realiza pouca ou nenhuma ação para implementar a Lei 10.639/03. Esse percentual inclui o maior grupo (53%), que realiza ações de forma menos estruturadas, episódicas e reativas, geralmente atreladas a projetos isolados ou em datas comemorativas, como o Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro. E também as secretarias que admitem não realizar nenhum tipo de ação para o cumprimento da lei, que representam 18% do total. Embora conheçam as normativas ou tenham estabelecido regulamentação local, essas secretarias desrespeitam a lei.
Só 29% das secretarias realizam ações consistentes e perenes para garantir a efetividade da lei. Essas redes têm em comum estrutura administrativa, regulamentação local, dotação orçamentária e periodicidade na realização de ações para atender às Diretrizes Curriculares Nacionais para as Relações Étnico-Raciais. Ainda que seja um número distante do ideal, ele revela que três em cada dez redes municipais adotaram práticas para a implementação da lei que devem ser acompanhadas, estimuladas e replicadas.
Entre outros dados, a pesquisa também revela que:
– A maioria das Secretarias Municipais de Educação não acompanha indicadores de desempenho dos estudantes por raça;
– Grande parte das secretarias afirma não ter recebido suporte suficiente de outros entes e instituições para a implementação da lei. Isto não só na forma de ações diretas, mas também por meio de cooperação técnica e financeira para que as bases estabelecidas pela lei não sejam apenas consideradas em datas comemorativas, mas sim de forma constante e integradas ao ensino como um todo;
– Em relação às principais dificuldades e entraves na implementação da lei, 42% dos respondentes apontaram a dificuldade dos profissionais em transpor o ensino nos currículos e nos projetos das escolas, enquanto 33% apontaram a falta de informação e orientação suficientes às secretarias sobre a temática;
– 69% das secretarias afirmam que a maioria ou boa parte das escolas realiza atividades relacionadas ao ensino de história e cultura africana e afro-brasileira apenas durante o mês ou semana do Dia da Consciência Negra. A porcentagem é maior entre os municípios do Centro-Oeste;
– Em relação aos temas que a rede municipal considera importantes de serem trabalhados nas escolas, “diversidade cultural” é o mais citado pelos gestores. Temas relacionados a “poder”, como construções de privilégios históricos e letramento sobre questões raciais, são menos priorizados.
Clique aqui para baixar a pesquisa completa.
Assista à transmissão ao vivo do lançamento dos dados da pesquisa, que acontece em Brasília (DF) no dia 18 de abril às 9h30:
A obra “A prioridade absoluta dos direitos de crianças e adolescentes nas cortes superiores brasileiras” apresenta e analisa todas as ações julgadas pelo STF e STJ sobre o tema entre 1988 e 2019
Nas últimas três décadas, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiram, juntos, mais de doze mil decisões em casos envolvendo direitos de crianças e adolescentes. Em uma análise inédita, o grupo de pesquisa Supremo em Pauta, da FGV Direito SP (Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas), com apoio do Instituto Alana, promoveu um estudo para entender como as cortes superiores brasileiras interpretaram esses direitos a partir da perspectiva da prioridade absoluta.
O livro A prioridade absoluta dos direitos de crianças e adolescentes nas cortes superiores brasileiras tem como autoras Eloísa Machado, Luiza Ferraro e Ana Laura Barbosa, pesquisadoras da FGV Direito SP, e será lançado nesta segunda-feira, 17 de abril, no Seminário Primeira Infância é Prioridade Absoluta, no Auditório Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília (DF).
O levantamento, que sistematiza todas as decisões proferidas pelo STF e pelo STJ em mais de 30 anos, entre 1988 e 2019, identificou 4.138 decisões proferidas no STF e 8.408 no STJ no tema da infância e adolescência. Predominaram, de maneira destacada, aquelas decisões que tratam sobre atos infracionais, seguidas das decisões relativas à esfera penal e à convivência familiar. As decisões foram categorizadas em oito temas: ato infracional, convivência familiar, inclusão de dependente, penal, políticas públicas, responsabilidade civil, trabalhista/previdenciário e tributário.
“Trata-se da mais extensa pesquisa já feita sobre a compreensão que os tribunais superiores têm sobre direitos da criança e do adolescente”, diz a professora Eloísa Machado, uma das autoras da pesquisa.
Para Ana Claudia Cifali, coordenadora jurídica do Instituto Alana, destacam-se os temas sobre políticas públicas, especialmente aquelas decisões que reconhecem a omissão ou negligência estatal e impõem deveres aos entes públicos, reconhecendo que o artigo 227 da Constituição impõe aos órgãos estatais competentes a implementação de obrigações previstas legalmente para garantir os direitos de crianças e adolescentes.
A publicação também apresenta casos paradigmáticos na garantia dos direitos dessa população, como a concessão de prisão domiciliar para todas as mulheres e adolescentes privadas de liberdade grávidas e mães de crianças com até 12 anos de idade, a proibição da censura em sala de aula, a declaração da ilegalidade da publicidade infantil e a limitação da superlotação em unidades de atendimento socioeducativo.
“Mesmo com o alto número de decisões proferidas em relação aos direitos das crianças e dos adolescentes, ainda há muito o que se avançar no âmbito doutrinário e jurisprudencial para delimitação dos significados dos termos ‘prioridade absoluta’ e ‘melhor interesse’. O estudo aponta, ainda, que os tribunais são, majoritariamente, chamados a interpretar o direito da criança e do adolescente em um contexto de responsabilização ou punição, sendo difícil identificar uma evolução histórica no modo como os tribunais interpretam a prioridade absoluta, até porque, o próprio conceito e seus termos correlatos são pouco frequentes nas decisões”, diz Ana Claudia.
A ausência de menção expressa à prioridade absoluta não significa, por si só, sua desconsideração. Mas a frequência de menções expressas é relevante em termos simbólicos, pela difusão da linguagem que veicula o paradigma da proteção integral. É por isso que olhar apenas para os casos nos quais há menção à prioridade absoluta diz pouco sobre o modo como os tribunais interpretam casos envolvendo crianças e adolescentes, motivo pelo qual a pesquisa considerou outros termos relevantes.
A partir da análise das decisões e suas fundamentações foi possível entender que, apesar do alto número de decisões proferidas, o STF e o STJ desenvolveram pouco o sentido e o alcance da prioridade absoluta e refletiram nas decisões problemas estruturais como a ínfima cultura de precedentes, o excessivo uso de decisões monocráticas e as dificuldades que o monocratismo impõe à padronização de decisões, especialmente no STF.
“A grande conclusão é que há ainda muito espaço para promover um avanço na interpretação da prioridade absoluta nos tribunais superiores”, finaliza Ana Claudia.
Assista ao lançamento da pesquisa no Seminário Primeira Infância é Prioridade Absoluta, no CNJ:
Dia Mundial da Síndrome de Down marca o início de uma parceria entre as instituições para o incentivo de pesquisas e programa escolar para pessoas com deficiência intelectual
Toda a sociedade deve se comprometer na garantia dos direitos de pessoas com deficiência para que elas possam ter uma trajetória profissional e acadêmica plena, com qualidade de vida, e realizar todo seu potencial com dignidade, igualdade e segurança.
Mais de 12 milhões de brasileiros têm algum tipo de deficiência, segundo o IBGE. Dentre eles, há em torno de 300 mil pessoas com síndrome de Down, segundo a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD). Mas muitas delas permanecem fora do mercado de trabalho ou não alcançam os níveis superiores da educação devido às diversas barreiras que enfrentam ao longo da vida. Da mesma forma, pesquisas na área da saúde mostram-se insuficientes por não fazer os investimentos e formações necessários e não considerar as especificidades dessas pessoas.
Diante desse cenário, o Alana se uniu à Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação da Universidade de São Paulo (USP), em associação com os professores Orestes Forlenza (Departamento de Psiquiatria da FMUSP), Wilson Araújo da Silva (FMRP-USP) e Daniele de Paula Faria (LIM-43, HCFMUSP), para oferecer no Dia Mundial da Síndrome de Down, 21 de março, um workshop para pesquisadores, profissionais da saúde e gestores sobre advocacy e incentivo em pesquisas sobre síndrome de Down.
A data marcou o início de discussões na universidade para a criação de uma Rede Brasileira de Pesquisa em Síndrome de Down e de um Programa Escolar na USP para pessoas com deficiência intelectual.
“Foi um dia histórico em que pudemos debater com a comunidade científica, a sociedade civil e autoridades governamentais pautas que podem mudar a realidade das pessoas com síndrome de Down no país. Estamos iniciando uma parceria que busca construir uma trilha acadêmica universitária para pessoas com deficiência intelectual, além de aumentar a carga horária sobre o tema nos cursos da universidade”, comenta Claudia Moreira, pesquisadora da Alana Foundation.
“Saímos do evento com o empenho da secretária de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, Márcia Barbosa, de dialogar para a construção de uma rede nacional de pesquisa sobre síndrome de Down. Estamos muito entusiasmados com os próximos passos”, finaliza.